terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Morto e feliz

Meu pai morreu sorrindo. Assim, feliz. Foi encontrado já morto numa cama de hotel numa cidade vizinha. Minha mãe também já tinha ido a essa altura, o que me deixou sozinho com a pergunta: “mas, sorrindo?”.

-Sorrindo, filho – disse-me o policial na entrada do hotel – Não temos detalhes ainda, mas aparentemente foi morte natural mesmo.

-Como assim, sorrindo?

-Não importa, filho, seu pai se foi. Você tem que ser forte.

-Eu estou sendo forte. Só estou sendo... Bom, estou confuso, quem é que morre sorrindo?

A pergunta ficou em suspense. O policial me levou ao tal quarto. Um quarto pequeno e escuro no terceiro andar, após três lances de escadas sujas e carpetes esfarrapados.

E meu pai estava lá, olhando para o teto manchado do quartinho. Estava vestido de terno e sapato. Seu livro de cabeceira, Operação Cavalo de Tróia, no criado mudo. Marcador de página no mesmo lugar em que esteve nos últimos dez anos; nunca se atreveu a tentar entender as notas de rodapé. Abajur aceso. E sorria, o desgraçado.

Cheguei do lado, fechei os olhos do meu pai e dei o comando que o povo de branco estava esperando. E eles levaram o velho embora.

Enquanto os funcionários do hospital recolhiam o cadáver sorridente do meu velho pai, o mesmo policial, resolvido de que eu precisava de consolo, colocou a mão no meu ombro.

-Sabe, filho, Deus escreve certo por linhas tortas. Lembre-se que Ele tem tudo desenhado para cada um de nós, e que em Sua infinita sabedoria achou por bem levar seu pai para o reino dos céus.

Sabendo que aquilo vinha de algum manual tipo “como confortar aqueles que perderam seus entes queridos”, balancei a cabeça afirmativamente para mostrar que eu tinha entendido, e evitar outro consolo memorizado. Funcionou, porque o policial se afastou e foi bolinar uma das enfermeiras.

Claro que eu estava triste. Meu pai tinha morrido, e isso era triste. Mas, ao mesmo tempo, toda vez que eu pensava “meu pai morreu...”, era impossível não completar o pensamento com “... sorrindo”.

Dias depois, com a morte de meu pai já devidamente superada, algumas lágrimas derramadas e várias visitas e telefonemas de condolências, fui ao apê do coroa resolver o fim que daria nas suas coisas. Muito teria que ir embora, pois minha casa não ia comportar todos os bagulhos que ele insistia em manter (mesmo porque, sendo seu filho, eu mesmo tinha meus vários bagulhos que já tomavam bastante espaço).

E, numa caixa razoavelmente grande, e quando digo razoavelmente quero dizer que caberia uma televisão de 29 polegadas dentro, encontrei inúmeros álbuns de fotografias. Muitos mesmo. Todos com incontáveis fotos do velho metido em todo tipo de balburdia e pornochanchada, datadas de, no máximo, meia dúzia de meses antes. E fotos de mulheres, claro, de todos os tipos. Mulheres novas e idosas. Algumas claramente profissionais; outras não tão claramente, mas, ainda assim... E em vários lugares diferentes, praias, hotéis e clubes noturnos.

Ali, vendo meu pai naquelas fotos, até então extremamente improváveis pra mim, reconheci o tal sorriso, emoldurado por vários tipos de situações diferentes e cercado de toda a gama feminina que ele conseguiu reunir. Não tive como não entender; o velho realmente morreu feliz.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Elric, Navegante nos Mares do Destino

Eu sempre quis ler algo de Michael Moorcock, criador de Elric e sua espada Stormbringer. Mas, com exceção feita às letras de músicas das bandas Blind Guardian e Domine, tudo a que tive acesso estava na internet. E tudo isso só atiçava ainda mais a minha curiosidade.

Mas, com um atraso de vinte anos, enfim pude ler a minissérie Elric, Navegante dos Mares do Destino. A HQ em quatro números foi lançada no Brasil em julho de 91 pela Abril Jovem, e é uma adaptação em cima da narrativa do Campeão Eterno, levada às páginas por Roy Thomas e Michael T. Gilbert.

Fiquei bastante feliz de ter esse primeiro contato com a mitologia de Moorcock pelo traço de Gilbert. Ao invés de guerreiros bombados e as mulheres com problemas de coluna que infestam os quadrinhos atuais, encontrei Elric e seus companheiros em traços elegantes e, por que não, misteriosos. Bastante condizente com a narrativa fantástica e onírica.

Embora condensando a obra de Moorcock, a minissérie é muito interessante. O personagem principal, Elric de Melniboné, é um monarca exilado, culto, em busca de algo que preencha um vazio que ele mal entende. Para tal, “navega” não em mares, e sim em planos, mundos, em busca de sua meta desconhecida.

A história de Elric, de certa forma, se assemelha à de Conan, o bárbaro cimério criado por Robert E. Howard, enquanto seu mundo é claramente influenciado pela literatura fantástica, com algo de Tolkien aqui, e um tanto de Lovecraft ali.

E, embora tenha gostado muito do Navegante nos Mares do Destino, a droga da minissérie só reforçou a minha vontade de conhecer melhor a obra de Moorcock. Diacho.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Modern Family


Depois de assistir às duas primeiras temporadas inteiras posso afirmar: Modern Family é a melhor série da TV atualmente. Ok, talvez definir como “a melhor série” seja amplo e agressivo demais. Mas que é uma das melhores, isso é.

Não cheguei a essa conclusão simplesmente porque ri demais das situações e personagens, ou porque o roteiro é extremamente ágil ao condensar em 22 minutos toda a rotina de três famílias (que na verdade formam uma única; e moderna!), ou porque todas as atuações são dignas de nota. Quer dizer, na verdade foi tudo isso junto que me levou à conclusão sim.

É difícil ficar impassível diante das situações cotidianas, mas absurdas, que o elenco infantil e pré-adolescente despeja em cada episódio. Desde o namorado roqueiro de Haley ao transtorno do déficit de atenção de Luke; das críticas ácidas de Alex à maturidade de Manny.

As composições das famílias da série foram muito bem escolhidas, abraçando alguns estereótipos e extrapolando outros. O casal de gays Mitchell e Cameron é o melhor exemplo. Não bastavam dois homens vivendo juntos, eles precisavam de uma filha adotiva. E asiática, como sempre recordam.

Ed O’Neill, muito bem como o patriarca Jay Pritchett, sabe mesmo liderar uma família cômica ao sucesso televisivo, embora o humor tosco e escrachado dos tempos de Married With Children tenham ficado bastante distante de Modern Family. Aqui é tudo mais sutil e delicado, embora às vezes banal, com uma perna no pastelão inocente da TV em preto e branco.

Modern Family já está em sua terceira temporada e, graças à enorme quantidade de indicações e prêmios, é bastante provável que continue por mais algumas. E eu, claro, agradeço.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Bioshock


Por muito tempo eu fiquei afastado da vida nerd dos videogames. Dos videogames. Embora vários amigos sejam entusiastas e passassem várias e várias horas de seus dias na frente das TVs e monitores, eu nunca me senti tentado a levar essa vida. Não que já não tivesse tido minha fase. Eu tive, quando era criança. Joguei muito no meu Atari e, depois, no super avançado Phantom System!

Mas, em tempos de jogos em CDs e DVDs, devo confessar que nunca me senti tentado. Alguns jogos me atraíram, claro, graças às tramas complexas e idéias inovadoras que só o mercado dos games mesmo é que poderiam me oferecer. E cheguei mesmo a jogar alguns. Mas nunca com a mesma vontade e satisfação que meus amigos. E raramente com algo próximo ao conceito de freqüência.

Mas, embalado pela opção do blue-ray, tive uma oportunidade e comprei um PS3. E, hoje, confesso, filmes assistidos no aparelho não chegaram nem no plural ainda. Filme, no singular. Um único. Mas os jogos... Esses já foram vários.

Comecei com o Assassins Creed; impressionantemente bonito e complexo. Passei pelo heavy metal do Brütal Legend, Resident Evil 5, o hit Batman: Arkham Asylum, Silent Hill: Homecoming, a nova edição do Prince of Persia e, enfim, naquele que é o objeto deste texto, por ter me espantado com um conceito sci-fi noir de muito bom gosto: Bioshock.

Eu sou completamente iniciante nesses jogos chamados shooters, em que você comanda o personagem em primeira pessoa. A falta da visão periférica e as constantes confusões entre as visões do personagem e do jogador me bagunçam a ponto de me perder completamente em mapas simples. Mas...

Mesmo sofrendo todas essas dificuldades, o jogo me atrai cada vez mais pra frente da TV. O cenário é absurdamente bonito, e a tensão criada pelos sons e pelas interatividades com os inimigos (e com alguns aliados) complementa muito bem a trama que vai se desenrolando.

Não preciso ficar falando sobre o argumento do jogo, que já é meio antigo e bastante famoso. No entanto, uma coisa que me chama a atenção é a abordagem direta que se faz em cima de algumas decisões que você toma com seu personagem. É o jogo conversando não com o personagem, e sim com o jogador. Muito interessante.

Tenho outros jogos na minha lista. Muitos hits que me sugeriram e, aos poucos, vou conhecendo. Mas, de cara, já posso afirmar que, por enquanto, Bioshock é o meu preferido.

domingo, 1 de janeiro de 2012

Memória podre

E eu realmente esqueci da existência desta porcaria.

Curioso como a criei como uma espécie de válvula de escape e a esqueci num canto. E como eu precisei duma válvula de escape em certos momentos...

Não posso afirmar com muita convicção mas, enfim, voltei.